Esta é a tradução de um artigo da Dra Melania Amorim, sobre o trabalho da doula!!! Super bacana!!
Em comparação
com os cuidados usuais, providenciar apoio contínuo intraparto aumenta a chance
de parto vaginal espontâneo, reduz a duração do trabalho e o uso de analgesia e
reduz a incidência de cesariana e parto instrumental. Adicionalmente, menos
bebês nascem com escore de Apgar menor que 7 no 5º. minuto e mães expressam
maior satisfação com a experiência do nascimento.
Comentário para a Biblioteca de Saúde
Reprodutiva da Organização Mundial da Saúde por Melania Amorim, MD, PhD e Leila Katz, MD, PhD
1. INTRODUÇÃO
Historicamente
e através das culturas, mulheres têm parido em casa e sido atendidas e apoiadas
por outras mulheres durante o trabalho de parto e o parto (1). No entanto, atualmente
a maioria das mulheres em muitos países dão à luz em hospitais, onde o trabalho
de parto e o parto são considerados eventos médicos, sendo as mulheres em trabalho de parto
tratadas como pacientes (2,3). Como conseqüência, o apoio contínuo intraparto
recebido pelas mulheres no passado está sendo perdido (4,5).
Nos
anos recentes, tanto mulheres e movimentos sociais como os gestores de saúde
têm clamado não somente por tornar mais natural o nascimento, mas também por
apoio um para um por e para mulheres durante o trabalho de parto. Em resposta a
esse clamor, modificações da prática têm ocorrido e o parceiro, membros da
família ou amigos têm tido a sua participação permitida durante o nascimento,
mesmo em locais institucionais como as salas de trabalho de parto e parto (6).
Os defensores da presença de familiares e amigos durante o trabalho de parto e
o nascimento defendem que essas pessoas podem providenciar apoio contínuo
intraparto.. Por outro lado, alguns
profissionais de saúde têm questionado se membros leigos da família ou da
comunidade podem ajudar as mulheres em trabalho de parto a lidar com a dor e a
ansiedade relacionadas com o nascimento (7). A presente revisão sistemática da
Biblioteca Cochrane (8) teve por objetivo avaliar os efeitos do apoio contínuo
um a um intraparto em comparação com os cuidados usuais.
2. MÉTODOS DA REVISÃO
Os
autores da revisão procuraram o Registro Cochrane do Grupo de Gestação e
Nascimento em busca de estudos sem aplicar qualquer restrição de linguagem. Os
critérios de seleção para incluir estudos nessa revisão foram ensaios clínicos
randomizados comparando apoio contínuo intraparto fornecido por um familiar ou
uma pessoa de fora da família (com ou sem qualificação profissional na área de
saúde) com os cuidados usuais. Mulheres grávidas em trabalho de parto foram as participantes
dos estudos. Em todos os casos, “cuidados usuais”não envolveram o apoio
contínuo intraparto mas poderiam ter incluído outras medidas, como uso
rotineiro de analgesia peridural para alívio da dor durante o trabalho de
parto.
Os
desfechos maternos primários foram qualquer analgesia/anestesia (medicação para
dor), uso de ocitocina sintética durante o trabalho de parto, parto vaginal
espontâneo, depressão pós-parto e sensaçãos negativas ou pontuação negativa
sobre a experiência de parto. Os desfechos neonatais primários foram admissão
em enfermaria de cuidados especiais e amamentação com 1-2 meses pós-parto. Os
desfechos secundários foram eventos intraparto (analgesia regional/anestesia,
duração do trabalho de parto, dor grave durante o trabalho de parto, nascimento
por cesariana, parto vaginal instrumental, trauma perineal (episiotomia ou
laceração requerendo sutura), baixo escore de Apgar com 5 minutos e
hospitalização neonatal prolongada, maternagem difícil e baixa autoestima no
período pós-parto.
Um
modelo de metanálise com efeito fixo de Mantel-Haenszel foi usado para combinar
dados e uma análise com modelo randômico foi adotada para comparações em que
houve elevada heterogeneidade. Nos casos em que ocorreu elevado risco de viés
associado com a qualidade dos ensaios clínicos incluídos, análise de
sensibilidade foi realizada para os desfechos primários. Análises de subgrupo
incluíram a conduta do serviço referente à presença de acompanhante,
disponibilidade de analgesia peridural, protocolo de monitoração eletrônica
fetal de rotina e variações nas características do provedor.
3. RESULTADOS DA
REVISÃO
Um
total de 21 ensaios clínicos envolvendo 15.061 mulheres foram incluídos. Os
ensaios clínicos tinham sido conduzidos sob diversas condições, regulamentos e
rotinas hospitalares. Houve notável uniformidade na descrição do apoio contínuo
intraparto em todos os ensaios clínicos, e em todos eles a intervenção incluiu apoio
um a um continuo ou praticamente contínuo, pelo menos durante a fase ativa do
trabalho de parto. Os autores da revisão classificaram a qualidade dos ensaios
clínicos como geralmente boa a excelente.
Dezenove
dos 21 ensaios clínicos incluíram menção específica de toque confortador e uso
de palavras de elogio e incentivo pelo provedor do apoio. Em 11 ensaios
clínicos a presença do parceiro ou outros membros da família foi permitida, mas
nos 10 outros ensaios clínicos nenhum apoio adicional foi permitido. Analgesia
peridural estava disponível de rotina em 14 ensaios clínicos e monitoração
eletrônica fetal foi usada de rotina em nove deles. Não foi possível comparar
os efeitos do apoio contínuo intraparto de acordo com a fase do trabalho de
parto (latente ou ativa). Os indivíduos que promoveram o apoio contínuo
intraparto variaram em termos de sua experiência de cuidadores do nascimento,
suas qualificações e a sua relação com as mulheres em trabalho de parto. Eles
poderiam ser parte da equipe hospitalar (como obstetrizes, estudantes de
Obstetrícia ou enfermeiras) ou poderiam ser outras mulheres ou não-membros da
equipe hospitalar, com ou sem treinamento especial (como doulas ou mulheres que
tinham dado à luz anteriormente).
As
mulheres alocadas para receber apoio intraparto contínuo tiveram maior chance
de ter parto vaginal espontâneo [risco relativo (RR) 1,08, intervalo de
confiança (IC) a 95%=1,04 – 1,12) e menor chance de receber analgesia de parto
(RR=0,90, IC 96%=0,84 – 0,97) ou relatar insatisfação (RR=0,69, IC 95%=0,59 – 0,79).
Além disso, elas tiveram menor duração do trabalho de parto (diferença média
de -0,58 horas, IC 95%= -0,86 – -0,30),
menor chance de serem submetidas a cesariana (RR=0,79; IC 95%=0,67 – 0,92) ou
terem parto instrumental (RR=0,90; IC 95%=0,84 – 0,96), analgesia regional
(RR=0,93; IC 95%=0,88 – 0,99) ou um bebê com escore de Apgar baixo no quinto
minuto (RR=0,70; IC 95%=0,50-0,96). Não houve nenhum efeito aparente em
intervenções intraparto como uso de ocitocina, problemas maternos (trauma
perineal grave, dor grave durante o trabalho de parto, maternagem difícil baixa
autoestima pós-parto e depressão pós-parto), outras complicações neonatais
(admissão em enfermaria de cuidados especiais e hospitalização prolongada) ou
amamentação com 1-2 meses pós-parto.
A
análise de subgrupo sugeriu que o apoio contínuo intraparto foi mais efetivo
quando fornecido por uma mulher que não era nem parte da equipe hospitalar nem
pertencia à rede social da parturiente. Também foi mais efetivo em locais onde
a analgesia peridural não estava rotineiramente disponível. Não foi possível
realizar a análise planejada de subgrupo baseada no tempo de início do apoio
intraparto.
4. DISCUSSÃO
4.1. Aplicabilidade
dos resultados
Os
benefícios do apoio contínuo in traparto em termos de desfechos maternos e
perinatais são claros, como demonstrado por essa Revisão Sistemática Cochrane,
e são consistentes em todos os ensaios clínicos em todos os lugares, apesar das
diferenças nas rotinas obstétricas, protocolos hospitalares e condições e
qualificações dos indivíduos que forneceram o apoio. Quando apoio contínuo
intraparto é fornecido, as mulheres têm mais partos vaginais espontâneos, menor
duração do trabalho de parto, menor uso de analgesia de parto, menor taxa de
cesarianas e partos instrumentais e menos bebês com baixos escores de Apgar no
quinto minuto. Além disso, as mulheres expressam mais satisfação com a
experiência de nascimento.
Embora
seja virtualmente impossível determinar a forma “ideal” de apoio contínuo intraparto,
os benefícios parecem ser maiores quando o apoio contínuo intraparto é
fornecido por uma doula. O apoio fornecido por doulas leigas está associado com
redução da duração do trabalho de parto e maiores escores de Apgar no quinto
minuto. Por outro lado, qualquer cuidador contínuo não pertencente à equipe
institucional (amigos, membros da família ou o pai do bebê) podem fornecer
apoio intraparto com redução do uso de analgesia e de partos operatórios.
4.2. Implementação da intervenção
Todos
os hospitais devem implementar programas que oferecem apoio contínuo para
mulheres durante o trabalho de parto. A presença de um acompanhante da própria
escolha da mulher deve ser permitida e encorajada. Uma alternativa para isso
pode ser a integração de doulas em maternidades para a prestação de apoio
contínuo a mulheres durante do trabalho de parto. Doulas são mulheres leigas
que receberam treinamento especial para fornecer apoio não médico para mulheres
e famílias durante o trabalho de parto, nascimento e período pós-parto (7,9).
Formuladores de políticas e administradores devem reconhecer que os melhores
desfechos são alcançados quando o apoio intraparto contínuo é fornecido por
prestadores que não fazem parte da equipe da instituição, especialmente doulas.
Isso é particularmente importante quando os formuladores de políticas de saúde
desejam reduzir taxas elevadas de cesariana em seus hospitais ou países.
Os
custos dos serviços de doulas, quando disponíveis, são geralmente repassados
para a família da mãe. Esses custos poderiam ser uma barreira para a prestação
de apoio contínuo intraparto. Considerando todas as vantagens e os possíveis
custos mais baixos para o sistema de saúde associados com a presença de doulas
(menor chance de cesarianas e de uso de analgesia), os formuladores de
políticas de saúde deveriam considerar cobrir os custos dos serviços de doulas.
Programas para treinamento e acreditação de doulas deveriam estar disponíveis
em todas as regiões do país. Cursos e programas para treinamento de doulas
comunitárias podem ser oferecidos por hospitais públicos e serviços primários
de saúde.
4.3. Implicações
para pesquisa
Agora
que os benefícios do apoio contínuo intraparto em termos de desfechos maternos
e perinatais em curto prazo estão bem estabelecidos, estudos ulteriores devem
investigar os efeitos do apoio contínuo durante o período pós-parto, bem como o
seu impacto em desfechos maternos e infantis em longo prazo. Esses desfechos
devem incluir, mas não devem se restringir às causas de morbidade materna, como
incontinência urinária e fecal, dispareunia, dor perineal prolongada e
depressão. A pesquisa no futuro também deve abranger algumas possíveis
vantagens do apoio contínuo, como maior facilidade no estabelecimento de
vínculo entre mãe e bebê e amamentação em longo prazo.
Estudos
comparando diferentes modelos de treinamento de provedores para o apoio
contínuo intraparto devem ser realizados, e comparações dos serviços de doulas
comunitárias ou doulas oferecidas pelo hospital ou doulas privadas também podem
ser realizadas. Todos esses estudos devem incluir análises econômicas de custos
e benefícios.
Referências
1.
Rosenberg K,
Trevathan W. Birth, obstetrics and human evolution. BJOG
2002;109(11):1199-1206.
2.
Davis-Floyd
RE, Sargent CF. Childbirth and authoritative knowledge: cross-cultural
perspectives. University of California Press; 1997:505.
3.
McCool WF,
Simeone SA. Birth in the United States: an overview of trends past and present.
The
Nursing clinics of North America 2002;37(4):735-746.
4.
Kitzinger S.
Birth your way. New York; NY: DK Adult; 2002:208.
5. Davis-Floyd
RE. Birth as an American rite of passage: second edition. University
of California Press; 2004:424.
6.
Davis-Floyd
RE, Barclay L, Tritten J, Daviss B-A, eds. Birth models that work. Berkeley,
CA: University of California Press; 2009:496.
7. Stuebe
AM,
Barbieri RL. Continuous intrapartum support. Uptodate. 2012. Available
at:
http://www.uptodate.com/contents/continuous-intrapartum-support?source=search_result&search=doulas&selectedTitle=1~6#H10.
Accessed
March 20, 2012.
8. Hodnett ED,
Gates S, Hofmeyr GJ, Sakala C, Weston J. Continuous support for women during
childbirth. Cochrane Database of Systematic Reviews 2011;Issue 2. Art. No.:
CD003766; DOI: 10.1002/14651858.CD003766.pub3.
9. Kayne MA,
Greulich MB, Albers LL. Doulas: an alternative yet complementary addition to
care during childbirth. Clinical Obstetrics and Gynecology. 2001;44:692-703.
Este documento deve ser citado como: Amorim MMR and
Katz L. Continuous support for women during childbirth: RHL commentary (last
revised: 1 May 2012). The WHO Reproductive Health Library; Geneva: World Health
Organization.
Fonte: Estuda, Melania, estuda!
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